Estatisticamente os evangélicos
deixaram de ser um grupo minoritário no Brasil há anos, e isso só está
surpreendendo cientistas sociais depois de o censo do IBGE de 2014 ter
divulgado dados em que aponta que 25% da população brasileira já se define como
tal: O que parece ser estatisticamente baixo se torna amplificado se pensarmos
a extensão territorial e populacional do Brasil.
Mas como isso ocorreu em um país
historicamente católico em tão pouco tempo? Obviamente, não foi do nada! E
pasmem, nem foi por tão pouco tempo assim: A história da igreja evangélica no
Brasil começa muito antes do que se imagina, com o Protestantismo de Imigração,
sendo que a primeira igreja protestante se estabeleceu no Brasil no ano de
1557, com os franceses (Igreja Reformada Francesa), seguida da Igreja Reformada
Holandesa, que foi estabelecida em 1630 (quase um século depois). O que ocorre
é que a partir daí foram dando-se saltos cronológicos para o estabelecimento de
outras denominações, como a Igreja Anglicana em 1816, a Luterana em 1824, a
Congregacional em 1858, a Presbiteriana em 1862, a Metodista em 1867, a Batista
em 1871, dentre outras, sendo todas estas as igrejas da Protestante Histórica.
Essas primeiras igrejas se
estabeleceram no Brasil inicialmente como produto de exportação de imigrantes
franceses, holandeses e ingleses, que obtiveram do Império a permissão para
estabelecer o seu culto no país, desde que as sedes das igrejas não possuíssem
nenhum tipo de aparência que as identificassem como templos religiosos (daí uma
parte a diferença arquitetônica entre igrejas católicas e evangélicas no
Brasil) e que as mesmas não fossem proselitistas (ou seja, que não
evangelizassem a população). Todavia, com o passar do tempo e com o aumento da
população no Brasil, seguido de pressões populares, a liberdade de culto e
evangelização foi sendo afrouxada. O estabelecimento destas igrejas no Brasil
passou a ser conhecido como Protestantismo
de Primeira Onda.
Todavia a liberdade de culto que
as igrejas hoje possuem só passou a ser permitida com o advento da República,
com o Estado Laico! Isso mesmo, parece ironia se olharmos hoje o fato de que, a
ideia de um Estado Laico (que é combatida por alguns fundamentalistas
religiosos de maneira absurda) foi a que permitiu parte da expansão da igreja
evangélica no Brasil.
Em 1910 fundou-se a primeira
denominação evangélica pentecostal no país, com a Congregação Cristã do Brasil,
seguida no ano seguinte por aquela que se tornaria como a maior denominação
evangélica desta vertente: A Igreja Assembleia de Deus – esta teve um papel
importantíssimo na propagação da mensagem evangélica no país, pois possuía um
cunho extremamente missionário (foi fundada por dois missionários suecos em
Belém - PA) com um discurso extremamente acessível à população com menor
instrução e nível econômico. Essas igrejas inauguram a Segunda Onda do Protestantismo Brasileiro, das igrejas pentecostais
que possuíam forte apelo nas camadas sociais mais baixas da população, e que
incorporavam elementos religiosos e linguísticos cada vez mais populares. Nelas
existe uma valoração muito extensa de elementos ritualísticos “mágicos” como
exorcismos, curas divinas, línguas estranhas ou outras manifestações do tipo,
sendo que os mesmos foram se incorporando com muito sucesso no imaginário e no
cotidiano de uma população sofredora e carente de assistência, em qualquer
nível, sendo que esta passou a ser fornecida mais pela igreja, do que por um Estado
incipiente.
Foi muito rápida a proliferação
de igrejas evangélicas pentecostais no país, alcançando lugares onde o próprio
Estado não alcançava: As favelas, os sertões, as florestas, os campos, as
periferias. E as denominações multiplicavam-se quanto mais se manifestavam as
incertezas e dificuldades dos líderes religiosos se acertarem teologicamente,
pois não era raro o fato de que, se um líder discordasse de outro em algum
aspecto teológico ou administrativo, este logo fundava uma outra denominação. E
assim ocorreu com igrejas como “O Brasil para Cristo”, em 1955; “Igreja Cristã
de Nova Vida” em 1960; “Deus é Amor”, em 1962.
Todavia este panorama desembocou
no que se conhece como a Terceira Onda do Protestantismo Brasileiro, inaugurado
pela Igreja Universal do Reino de Deus, em 1977, por dois nomes famosos: Edir
Macedo (atual líder supremo da denominação) e R.R. Soares, que saiu
posteriormente para fundar a Igreja Internacional da Graça de Deus, em 1980. E
aqui faço um parágrafo somente para a Igreja Universal
A Igreja Universal do Reino de
Deus é, para mim, um dos modelos mais estranhos e bizarros do protestantismo
brasileiro, pelo simples fato de seu modelo altamente sincrético e sucursal.
Começou no fim da década de 1970 com um apelo sincrético muito forte com o
catolicismo, na mesma medida em que combatia-o (a Igreja Universal incorporou
elementos como a “água ungida”, cujos pastores pediam para colocar no
televisor, como um modelo “evangélico” de água benta), depois passou a
sincretizar elementos das religiões afrobrasileiras (quem não conhece as
famosas “Sessões do Descarrego” das terças-feiras da IURD, à semelhança das
sessões homônimas nos centros de umbanda?!), e recentemente está incorporando
elementos do judaísmo (Templo de Salomão, “Arca da Aliança”, etc) em sua
parafernalha religiosa. Esta igreja fez “escola” ao dar origem à Igreja
Internacional da Graça de Deus, em 1980, e à Igreja Mundial do Poder de Deus,
em 1998 (note que não faltam superlativos para valorizar o nome das “igrejas”).
Enfim, paro por aqui, pois esta igreja merece um texto só para ela.
Mas o fato é que a Igreja
Universal começou mais agressivamente à conversão de fiéis no Brasil, e
exportou-se para o mundo com muito sucesso, sendo uma das maiores igrejas “evangélicas”
do mundo. Começou também com um discurso muito voltado para as camadas pobres
da população, tendo um giro discursivo muito grande ainda na década de 1990,
quando passou a focar-se nas classes média e alta da população. Mas a terceira
onda protestante no Brasil não iniciou-se somente com a Universal: Igrejas
muito diferentes mas com discursos também próximos à “Batalha Espiritual” e a “Teologia
da Prosperidade” logo ganharam notoriedade.
Um grupo específico de igrejas,
que originou-se com um movimento importado da Colômbia a partir da década de
1990, o chamado G12 (que depois ganhou outros nomes como M12, ou MDA), foi o responsável
por outro salto no objetivo imperialista evangélico brasileiro. A chamada “visão
celular” trazida por tal movimento, fez de “cada casa uma igreja, e cada crente
um ministro”, ampliando ainda mais o alcance territorial de tais igrejas. A partir
daí começou-se toda uma teologia sui
generis do movimento evangélico, recheada de novidades como a reintrodução
dos “apóstolos” no Brasil, como a nova onda de “batalha espiritual” (esta mais
atualizada e modernizada, diferentemente da Universal cujos grandes vilões eram
os “Exus” e “Pombas Giras”, esta passa a incorporar outros vilões como o do
movimento New Age, e etc). Aqui englobam-se as Igrejas Renascer em Cristo
(1986), o Ministério Internacional da Restauração – MIR (1992), a Igreja Sara
Nossa Terra (1992), a Igreja Fonte da Vida (1994), Igreja Nacional do Senhor
Jesus (1994), dentre outras. O que acontece é que tais igrejas passaram a ter
uma capilaridade muito grande, maior poder político, econômico e social, e um
discurso mais light voltado para uma classe de jovens, adolescentes e até mesmo
de adultos que não se enquadravam no perfil pentecostal ou histórico. Estas
igrejas passaram a ser chamadas de Igrejas Neopentecostais e tiveram maior
sucesso frente às mídias e a modernidade. Nota-se porém que nem todas estas
igrejas são de uma teologia em comum, mas possuem raízes que se enquadram em
certos movimentos.
O que acontece é que, mesmo com o
atual crescimento de tais denominações, parece que os recentes escândalos e o
crescimento da escolarização do brasileiro, tem feito com que ocorra um
fenômeno singular: O crescimento dos “desigrejados” de base protestante. Sim!
Nem todo ex-evangélico pode se caracterizar na alcunha que as igrejas dão de “desviado”.
Muitos jovens e adultos tem experimentado um novo movimento de fé
desistitucionalizada e que parece estar assustando os líderes proselitistas de
tais congregações.
O fato é que precisamos conhece
um pouco da história do movimento evangélico brasileiro par diferenciar entre
as suas linhas de pensamento e as suas teologias, para tentar lançar luz sobre
o comportamento religioso do Brasileiro, e não colocar “todos no mesmo saco”.
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